SP em Debate


Perguntamos a especialistas se eles são favoráveis às políticas de transferência de renda

Sergio Tiezzi
Chefe de gabinete da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico e assessor do Ministério da Educação à época da implantação do Bolsa Escola Federal.

“Sou favorável por diversos motivos. Os programas de transferência de renda criados a partir do governo Fernando Henrique são interessantes porque são relativamente simples do ponto de vista gerencial e de implementação. O cadastro das famílias é realizado pelas prefeituras, depois é atribuído o benefício e emite-se um cartão bancário que permite à população beneficiada ter acesso ao recursos por meio do sistema bancário. Outro ponto é que este tipo de programa, regra geral, são desenhados para as mães, ou seja, são um mecanismo de combate ao fenômeno da feminilização da pobreza. Isso é um avanço, porque é um mínimo de garantia de sustento a essas chefes de família. Há também uma garantia de cobrança da qualidade do cadastro. A partir do momento que é o prefeito ou a prefeitura quem é responsável pelos programas, portanto é muito mais fácil identificar os responsáveis por possíveis fraudes. E esses programas vêm tomando maturidade institucional.

Vale dizer que a transferência de renda em si não vai tirar ninguém da situação de pobreza, mas se você obriga, por exemplo, as crianças a estudarem por oito, dez, doze anos, há uma chance delas saírem da pobreza. Caso o poder público não cobre a contrapartida por parte das famílias, esses programas serão assistencialistas. Outro ponto necessário é agregar valor ao benefício, acoplar outros programas sociais para aumentarem as chances de saída da pobreza, como capacitação profissional, micro-crédito, benefícios habitacionais etc. Ainda há muito a se fazer. É prematuro fazer uma avaliação de impacto sobre os resultados, pois os programas são recentes, têm apenas cinco anos. Mas ainda vale fazer esse investimento social.”

Celi Scalon

Acredito que a única forma de combater as desigualdades sociais e, mais especificamente, a desigualdade de renda, é através de políticas redistributivas. O crescimento econômico é condição necessária, mas certamente não é condição suficiente para resolver a desigualdade profunda e estrutural em que está mergulhado o país. Essa foi uma crença comum no passado e ainda povoa o discurso de alguns políticos e economistas. Mas a experiência brasileira nas décadas de 60 e 70, e de outros tantos países de industrialização tardia, mostra que, em contextos de extrema desigualdade, a riqueza gerada pelo crescimento tende a se concentrar nas mãos de poucos. Tampouco podemos apostar no investimento em capital humano como uma saída de curto ou médio prazo. Essa também é uma condição necessária, mas não é suficiente para resolver o problema da pobreza e desigualdade. A educação pode ser, e no Brasil é, reprodutora de desigualdades; além disso, é um tipo de política que atinge apenas uma parcela da população (jovens e crianças).

A resistência às políticas de transferência de renda não é exclusividade do Brasil. Elas são criticadas mesmo em países europeus com longa história de práticas políticas desta natureza. Nessas críticas muitas vezes o que está implícito é a idéia de que os beneficiários dos programas devem ser “merecedores” (deserving poor). Daí a imposição de condicionalidades, tais como freqüência à escola, trabalhos comunitários, estar buscando emprego etc. Na minha opinião a questão não deve mais se colocar contra ou a favor dos programas de transferência. Devemos avançar nesse sentido e nos perguntar qual tipo de programa é mais eficiente. E, melhor, sem condicionalidades.

 

diverCIDADE - Revista Eletrônica do Centro de Estudos da Metrópole