Educação
Qualidade é
o maior desafio após universalização
do ensino
Especialistas
sugerem reformas no sistema educacional, como professores
mais qualificados e autonomia, principalmente nas escolas
da periferia.
Audrey
Camargo
A
pesquisa sobre o acesso dos pobres aos serviços públicos
realizada pelo Centro de Estudos da Metrópole –
CEM/Cebrap, apresentada nessa edição, confirmou
dados apresentados pelo Ministério da Educação
de que o ensino está praticamente universalizado em
todo o país. Mas, apesar dos avanços conquistados,
o sistema ainda sofre com graves deficiências que prejudicam
a qualidade do serviço oferecido.
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Profissionais
ouvidos pela reportagem apontaram algumas das falhas
na organização do sistema educacional:
deficitária formação dos professores,
falta de investimentos e autonomia das escolas e valores
educacionais relativamente pobres que as crianças
trazem de suas famílias.
Guiomar
Namo de Mello, diretora da Escola Brasileira de Professores
(Ebrap), informa que não há focalização
de recursos onde mais deveria, a periferia com alta
concentração de gente, “O Brasil
está relativamente bem organizado em matéria
de financiamento, mas o dinheiro é pouco e sempre
mal gasto”.
As
escolas de periferia, que já são afetadas
pelo caos do seu entorno e pela descontinuidade das
políticas públicas, sofrem com a falta
de investimentos em suas necessidades específicas.
Para Mello, “O diretor tinha que ter direitos
e critérios para distribuir o dinheiro”. |
José
Francisco Soares, do grupo de Avaliação e Medidas
Educacionais – FAE/UFMG, concorda: “É preciso
implementar políticas escolares e ações
que ocorram no nível da escola e incentivem a sua autonomia.
Essas ações devem ser de cunho pedagógico,
gerencial e social. Não há uma única
maneira de ensinar, mas várias. Cada escola deve escolher
a sua e implementá-la. A liderança e o envolvimento
da direção é crucial”.
Outro
problema apontado é o funcionamento da pedagogia
no Brasil, os cursos universitários são
excessivamente teóricos e não há
uma mediação do que é aprendido
com o que deve ser levado aos alunos. “É
considerado que não se deve ensinar mais nada
aos professores. Eles têm um curso ruim, entram
numa escola em situação de alto risco
e o que ele vai inventar? Não tem material para
ensinar o professor como dar aula, é considerado
ofensivo, os pedagogos se ofendem. Nunca foi discutido
o perfil profissional do professor que as universidades
querem formar”, aponta Guiomar Mello.
Soma-se a isso a falta de professores em matérias
como física, química, matemática
e biologia, principalmente nas escolas públicas,
onde os salários são menores, o que acarreta
uma defasagem na formação desses alunos
em relação aos das escolas particulares.
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Guiomar
Nano de Mello |
Mas
não é apenas a questão salarial que afasta
os bons profissionais das escolas da periferia, os professores
que conseguem melhor pontuação nos concursos
públicos terminam por escolher as melhores escolas,
na maior parte das vezes localizadas em regiões centrais
mais seguras. Ainda segundo a diretora do Ebrap, “Seria
melhor dar um incentivo para os professores que vão
para as piores escolas, tanto no município quanto no
Estado. Mas no arcabouço político brasileiro
os adicionais tendem a ser incorporados e isto é um
perigo, por exemplo, para a previdência. Exigiria uma
reforma do Estado”.
A
evasão e repetência escolares também são
preocupantes. Dados apresentados por Mello revelam que 47%
das crianças do Estado de Pernambuco não conseguiram
passar para a segunda série no ano de 2003 e 52% no
Maranhão. Na sua opinião, o problema é
a escola não saber trabalhar com os mais pobres.
Francisco Soares |
Para
combater a falta de incentivo para o estudo, motivada
por um ensino ruim e pela falta de perspectiva, é
necessária a realização de políticas
públicas que visem melhorar o ensino dado a essas
crianças; além de ações
dirigidas aos pais, para que estes repassem aos seus
filhos a importância da educação.
“Você tem que ter um jeito de mexer um pouco
na cultura da família, nessa cultura do conformismo,
do jeitinho brasileiro”, diz Guiomar Mello.
Para
Francisco Soares é preciso transformar a escola
em um projeto integrado com a comunidade, principalmente
nas periferias das grandes cidades. “Mas tudo
isto deve ser monitorado pela sociedade através
da medida dos resultados escolares dos alunos. E a sociedade
deve estar preparada para recompensar financeiramente
a equipe da escola.” Haroldo Torres, pesquisador
do CEM, concorda: “O Estado pode melhorar o sistema
educacional realizando uma avaliação periódica,
comparável e sistemática, produzindo estímulos
simbólicos e monetários para professores
que trabalhem com grupos muito pobres, investindo em
infra-estrutura educacional”.
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“Para
promover a autonomia da escola a Secretaria tem que fortalecer
seu sistema de avaliação e monitoramento das
escolas. Tem que haver prestação de contas”,
diz Guiomar.
Os
especialistas, dessa forma, indicam soluções
comuns: mais dinheiro do Estado; avaliação,
acompanhamento e controle das ações concretizadas
e do gasto financeiro; investimento no professor e na metodologia
de ensino; além da participação social
e familiar, como forma de supressão das deficiências
nas escolas, essencialmente as localizadas em regiões
mais pobres.
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