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MÍDIA E A REPRESA: BRIGA SOBRE O DESTINO DA GUARAPIRANGA
Na
Região Metropolitana de São Paulo, o debate
acerca da questão ambiental possui lados interessantes.
Um dos itens, a preservação da Represa Guarapiranga,
chamou nossa atenção para a discussão
que ocorreu na grande imprensa.
Rafael Duarte Oliveira Venancio e Francisco Toledo
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Depois
de 14 meses da sua sanção, a Lei Específica
da Bacia do Guarapiranga, que antes era motivo de festa,
causou polêmica através de uma repercussão
na imprensa escrita. Tudo começou com um e-mail
fictício do ex-governador do antigo Estado da Guanabara,
Carlos Lacerda, para o atual governador de São
Paulo, José Serra.
Esse texto, escrito por Elio Gaspari em sua coluna na
Folha de S. Paulo de 11 de março de 2007,
colocava um grande aviso: “Interdite a insânia
do seu secretário de Meio Ambiente, Francisco Graziano
(como a mim, chamaram-no de Corvo). O moço, associado
ao prefeito de sua capital, anuncia a remoção
de 30 mil miseráveis que vivem na orla da represa
de Guarapiranga”. |
Gaspari,
usando a imagem do político carioca como fantoche,
continua dizendo que louva “o projeto, mas seu colaborador
não informa para onde irão as famílias
desalojadas, muito menos enuncia o compromisso de instalá-las
por perto. Seu centurião enumerou 22 ações
previstas para a área. Nenhuma trata do destino dessa
gente pobre. Refere-se apenas a ‘abrigos de emergência
para apoio a remoções ou desfazimentos’”.
A resposta do Governo foi rápida e logo saiu no “Painel
do Leitor” da Folha do dia seguinte. “A coluna
de Elio Gaspari de ontem, a respeito da represa de Guarapiranga,
acabou prestando um serviço de desinformação
aos leitores deste jornal”, avisava Vera Freire, da
Assessoria de Imprensa da Secretaria do Meio Ambiente.
Segundo ela, “trata-se de remover, oferecendo moradias
novas, cerca de 5 mil famílias -estimativa preliminar
das que moram em palafitas, beiradas dos córregos que
formam o manancial e nas margens da própria represa-
e não 30 mil ‘miseráveis’, como
afirma o colunista, que ‘ficariam sem destino e sem
moradia’. Uma averiguação cuidadosa teria
evitado esse engano. A maioria dessas famílias, é
bom esclarecer, corre riscos sanitários e de desabamentos.
Ninguém vai piorar de vida”.
Como encerramento, ela declara que “o jornalista omite
uma informação essencial aos leitores: ele não
esclarece que Guarapiranga fornece água de beber a
3,7 milhões de habitantes da região metropolitana
de São Paulo e que a ocupação desenfreada
de suas margens já vem de há muito comprometendo
esse abastecimento e a saúde da cidade, devido ao esgoto
e ao lixo jogados na represa”.
A resposta de Gaspari esteve na sua coluna do domingo seguinte.
Personificando Lacerda novamente, diz que “seu aparelho
de comunicação zangou-se. Pena. As informações
vieram, formalmente, de seu dispositivo. Dele eu havia recebido
o texto intitulado ‘Governo e prefeitura apresentam
ações concretas para a Guarapiranga’.
Lá podia-se ler: ‘A estimativa é que a
remoção vá atingir inicialmente cerca
de 30 mil moradores’”.
Já que o personagem utilizado era conhecido por sua
retórica combativa, Gaspari continua a dizer que, “na
contradita, os doutores corrigem: são 5.000 famílias.
Brincam de números. Se o senhor e seus palafreneiros
querem remover 30 mil pessoas da beira de uma represa para
preservá-la, volto a louvar a iniciativa, mas insisto:
diga para onde irão. A que distância ficarão
do local em que vivem hoje?”.
A notícia que Gaspari se refere pode ser encontrada
no site da Secretaria do Meio Ambiente. Assinada por Eli Serenza,
deixa claro que “as ações incluem a remoção
das habitações que ocupam áreas de preservação,
entre 30 e 50 metros da margem dos cursos d’água
ou estão localizadas em terrenos com grande declividade.
Os levantamentos realizados indicam que cerca de 30 mil
pessoas encontram-se nessa situação e a
prefeitura já vem realizando a remoção
nos casos das moradias mais recentes e nas situações
de desrespeito flagrante, como é o caso de construções
localizadas há cerca de 15 metros da represa”.
Nessa mesma semana, uma outra matéria, derivada
sobre o mesmo assunto, causou polêmica. A matéria
“Um cenário de faroeste”, escrita por
Sérgio Duran e publicada no Jornal da Tarde
do dia 25 de março de 2007, traçava
um panorama dos bairros Vila Gilda, Jardim Aracati e Flórida
Paulista. Todos eles estavam às margens da represa
Guarapiranga. |
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Segundo
a matéria, esses bairros são dominados pela
organização criminosa Primeiro Comando da Capital
(PCC) e que lá “na Vila Gilda repete o que ocorre
na Guarapiranga, há pelo menos 30 anos. Os terrenos
são invadidos com a anuência do proprietário,
ou por um grileiro. Uma associação é
montada - geralmente ligada a um deles - e cobra prestações
dos invasores. Aterrar para construir na área da represa
que abastece 3,7 milhões de paulistanos, de Santo Amaro,
Campo Limpo, Morumbi e Butantã, custa de R$ 60 a R$
200 mensais. A novidade é a entrada do PCC nas associações.
'Em alguns lugares são eles que cobram, sim', diz um
morador que não quer ser identificado. 'Mas são
justos na cobrança'”.
Essa notícia repercutiu nos diversos meios de comunicação,
principalmente na Internet, aonde notas era redigidas baseadas
apenas na apuração de Duran. O próprio
jornalista, na matéria original, tinha relatado dificuldades
no trabalho de campo para a captação de material.
No entanto, no mesmo dia 25 de março, Sérgio
Duran adiciona uma retranca para O Estado de São
Paulo sobre a mesma temática. Reintitulada por
uma empresa de clipping “Eles gostam de ‘estragar’
a água do ‘pessoal do Morumbi’” (baseando-se
no lead da retranca), o jornalista faz um retrato do bairro
Vila Muriçoca: “Todos ali sabem que são
ilegais e chegam a se divertir com o fato de estarem ‘estragando’
a água que ‘o pessoal do Morumbi’ bebe.
Mas afirmam não enxergar outra opção
de moradia. "Ah, pode ser o que for, mas eu estou no
céu", conta a auxiliar de limpeza Roseli Rezende
dos Santos, de 34 anos, que trocou Osasco pela Muriçoca.
‘Melhor do que pagar aluguel’.
Pensando nesse cenário midiático, a revista
DiverCIDADE, representada pelos repórteres
Rafael Duarte Oliveira Venancio e Francisco Toledo, resolveu
escutar o outro lado da questão, tratado meramente
como objeto (pela discussão Gaspari-Secretaria do Meio
Ambiente) ou como estereótipo (pelas matérias
de Sérgio Duran).
Em reportagem publicada nessa edição,
fomos até a Vila Gilda, citada por Duran na primeira
matéria, para conhecer (e saber se é verdade)
a história daqueles que, segundo o repórter
da Agência Estado, “gostam de estragar a água
do Morumbi”.
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