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DiverCIDADE 14
julho- setembro de 2007

TRANSIÇÕES DA JUVENTUDE

MATÉRIAS
> De jovens a adultos: a transição em transição

> A Juventude ainda pulsa

REPORTAGENS
> Etnografias revelam dinâmicas das tribos urbanas
REPORTAGENS HÍBRIDAS
> Jovens e o mercado de trabalho
> Cinco formas de a juventude se organizar politicamente
> Mesas redondas do vestibular: diálogos acerca da transição
SLIDE SHOW
> Mortalidade juvenil em breves números
ARTIGO ASSINADO

> Uso de substâncias psicoativas ilegais e juventude: algumas ponderações

ENTREVISTA
> Entrevista com Silvia Borelli
WIKIRESENHA

> De juventude transviada à rebelde: Juventude no Cinema

SP EM DEBATE
> O que mudou de fato no comportamento dos jovens depois da internet?
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Reportagem Híbrida
Mesas redondas do vestibular: diálogos acerca da transição

No texto, cinco vestibulandas metropolitanas conversam para buscar esclarecer a transição que passarão através do vestibular. Já no vídeo, os alunos do Núcleo de Consciência Negra falam de suas experiências e expectativas.
Rafael Duarte Oliveira Venancio e Francisco Toledo

vestibular De certa forma, a grande quantidade de matérias de comportamento publicadas na mídia tem uma função bastante clara: aconselhar sobre uma determinada situação da vida do leitor. Quando se trata de juventude, os cadernos e revistas especializadas têm um assunto preferido, na segunda metade de cada ano que passa, que atende pelo nome de vestibular.

Vestibular significa, segundo o dicionário Houaiss, exame “que aprova e classifica os estudantes a serem admitidos nos cursos superiores”. No entanto, ele mostra que sua raiz, “vestíbulo” do latim vestibulum, significa “espaço entre a porta de entrada de uma casa e a rua”, conhecido como soleira.

Ora, ao falar de vestibular, sua própria etimologia nos avisa que estamos tratando aqui de uma transição. Transição de certa forma análoga àquela retratada nas matérias acerca da passagem para vida adulta através do trabalho ou da inserção do jovem no mercado de trabalho. Pois, como disse a vestibulanda Deborah Ferreira, vestibular, para ela, “é importante para fazer um primeiro filtro na entrada do mercado de trabalho e para ver o que aprendeu, pois estudamos, de certa forma, para trabalhar”.

Mas, como conseguimos essa fala? Assim como os diversos veículos midiáticos, a revista DiverCIDADE se propôs a realizar duas mesas redondas: uma, representada pelo texto,  com 5 vestibulandas de Santo André (Deborah Ferreira, Amanda Casadei, Carla Zuccherelli, Fernanda Cruz e Karen Chibana), na Região Metropolitana de São Paulo. A outra, representada pelo vídeo, mostra os alunos do Cursinho do Núcleo de Consciência Negra debatendo seus interesses, tanto no cursinho, quanto para o futuro.
Buscamos aqui algo mais próximo de uma “construção de mundo” via Hannah Arendt.  Filósofa política, ela afirmava que, em “tempos sombrios” (onde, de certa forma, podemos encaixar as transições), é preciso exaltar uma esfera pública do diálogo, onde “a verdade só pode existir onde é humanizada pelo discurso, onde cada homem diz não o que acaba de lhe ocorrer naquele momento, mas o que ‘acha que é verdade’”.



Situação essa que abriu o diálogo da mesa, realizada no restaurante próximo ao colégio onde estudam, com a pronunciação da frase: “Eu acho que quem inventou o vestibular devia morrer”. O “inconvencional” também está presente na própria constituição da mesa. Das cinco, duas (Fernanda e Karen) não vão prestar FUVEST, o maior vestibular do país; e quatro escolheram carreiras não tradicionais: Fernanda e Karen optaram por Moda, Deborah escolheu Produção Musical e Amanda escolheu Midialogia.

Assim, além da pauta da injustiça, também entra aquela que fala acerca das falhas dos Ensinos Técnicos. Para Karen, é uma falha não ter Moda nas ETEs ou FATECs. O problema vai além de uma mera opção, pois a imagem que se tem dessa transição é de que a FUVEST ou até mesmo o Ensino Superior é o único caminho.

Sobre o colégio em que estudam, com filosofia de ensino voltada para vestibular (lá o 3º ano do Ensino Médio é divido em 2 semestres: um com a matéria convencional e outro apenas com revisão de matéria), entram em consenso que, apesar de ser importante para “se ligar” antes da prova, “não pode grudar na paranóia deles, se não fica louco”. Ficando “louco”, não se consegue ter bom rendimento na prova e nem aproveitar a viagem de formatura para Florianópolis, milimetricamente colocada um mês antes dos vestibulares (exceto para aqueles que prestaram na Anhembi-Morumbi como Karen, Deborah e Fernanda).

Após os assuntos mais pontuais, a conversa entra na discussão da transição em si: passar ou não no vestibular (até mesmo passar ou não no 3º ano como lembra Fernanda), morar fora, dependência ou não dos pais e até mesmo se não era muita coisa para mudar logo na entrada dos 18 anos. “É muito cedo. Tanto que eu achava que deveria ter mais um ano para escolher”, afirma Deborah, cuja opinião é rebatida por Amanda: “mas aí só existiria mais um ano de colégio e atrasava em um ano as decisões todas. Dá na mesma!”.

Para Amanda, a transição já está acontecendo para alguns e para outros dificilmente vai acontecer,  pois, “do 2º para o 3º, mudou muito. Pelo menos, eu sim. Mas, basta olhar para a nossa sala: tem gente que leva sério e tem gente que fica falando durante a explicação”. Só que a transição em si não é sinônimo de independência, “mas também não podemos dizer que não muda em nada”, lembra Carla.

Já a relação com os pais se torna um ponto importante. Uma não quis seguir a carreira de médico praticada por eles e outra faz FUVEST apenas para agradá-los (e outra não se deixou seduzir pela chantagem paterna). Para uma, os pais bloqueiam o desejo de fazer universidade fora da RMSP e no caso da outra, os pais incentivam. Tudo isso caracterizando um reconhecimento da preocupação paternal, mas sem esquecer da necessidade de se seguir o que quer.

Quando a temática da saudade do que ficará para trás foi mencionada, todas lembraram do clima bom do colégio, mas há a compensação de estar estudando e buscando o que gosta. “Se não fosse fazer Moda, não sei o que faria”, lembra Karen. Já expectativas para o que virá, a mesma resposta passou na cabeça (e saiu da boca) de todas: tempo livre.