Esther Hamburger
Por que a telenovela, um fenômeno eminentemente popular, deve ser estudada pela academia? Justamente porque é um fenômeno popular, policlassista, assistido nas mais variadas regiões geográficas do país, por um público de diversas idades. Em outras palavras, é um fenômeno nacional. Além de ser popular, e por ser popular, a novela é também o produto televisivo mais lucrativo. Sua importância econômica, como carro-chefe de uma das maiores indústrias de televisão do país é outro motivo que justifica o estudo acadêmico. Vale enfatizar, como um parênteses, que há poucos trabalhos nessa linha de economia do audiovisual. Como você se interessou e se envolveu com o tema? Como pesquisadora do Cebrap, trabalhei com movimentos sociais urbanos e com a relação entre esses movimentos, nos bairros, e as agências públicas, da prefeitura. Ao trabalhar nessas pesquisas percebi que a atuação na TV desempenhava um papel de interlocução entre diversos movimentos de bairros diferentes. Fui fazer doutorado nos EUA com a idéia de estudar televisão americana. Ao decidir trabalhar com a TV brasileira as novelas me pareceram o tema natural, especialmente pelo caráter nacional de sua audiência e de suas narrativas. O que você acha da televisão em termos de qualidade? O que você gosta de assistir? A televisão não existe no abstrato. Há televisões e televisões, a depender da estrutura, pública, privada ou mista, do país em que ela se encontra e do determinado período de que se fala. No caso do Brasil, a qualidade da TV caiu sensivelmente nos últimos 15 anos. Além da telenovela, você estuda outros aspectos da televisão? Acabo de terminar uma pesquisa sobre os índices de audiência do Ibope com referência a diversos programas. Essa pesquisa dá continuidade à problemática abordada no capítulo 3 do meu livro ( O Brasil Antenado ). A questão posta é de interesse teórico: como a disjunção entre sociedade e mercado vigente no Brasil (de maneira mais acirrada nos anos 70 e 80) abala os princípios da teoria pluralista que guia a pesquisa de mercado? Que questões essa disjunção coloca para a consolidação da democracia? Em função da pesquisa de recepção de novela da qual participei enquanto pesquisadora do Cebrap, desenvolvi um projeto atualmente financiado pelo CNPq em que pretendo investigar as relações de telespectadores em bairros pobres com diversos meios de comunicação, em especial com o boom de filmes recentes que abordam sua situação. Qual a importância do trabalho de crítica televisiva que faz no jornal? Talvez os leitores estejam em melhor posição que eu para responder essa questão. Do meu ponto de vista é muito interessante exercitar a atividade crítica abrindo interlocuções mais amplas que a academia. Cabe ressaltar que, enquanto fazia pesquisa, minha atividade no jornal funcionou para mim como uma espécie de caderno de campo público, uma forma de exercitar o meu olhar sobre o que estava indo ao ar e ao mesmo tempo compartilhar minhas observações, de certa maneira participando do sistema de interlocuções que é o fazer e assistir novela. Qual a importância de suas passagens pelo exterior, na University of Texas e University of Chicago? A experiência no exterior é muito interessante, ela oferece a oportunidade de entrar em contato com bibliografia diferente e com interpretações diferentes da mesma bibliografia. A possibilidade de olhar comparativamente e o distanciamento que a estadia no exterior oferece é muito enriquecedora. Quais são os maiores obstáculos na sua carreira de pesquisadora? As condições de trabalho no Brasil estão muito difíceis. As universidades estão depauperadas, suas estruturas estão hiperburocratizadas, há pouca infra-estrutura para pesquisa. Quais são seus projetos futuros? Pretendo desenvolver o projeto acima mencionado, se possível consolidando uma equipe de pesquisa que ajude a enfrentar os problemas acima expostos. Estarei em breve dando um mini-curso sobre esse novo projeto na Universidade de Michigan. |
||
Versão para Impressão |