Número Seis - julho/agosto/setembro de 2005
Matérias

Redes sociais: uma porta de saída

Além dos já tradicionais indicadores socioeconômicos, a estrutura de relações sociais é outro fator importante para conhecer mais profundamente o fenômeno da segregação e da pobreza. Um dos motivos por trás do pior desempenho social em áreas segregadas provavelmente se dá porque as redes de relações sociais, que maximizam o aproveitamento dos recursos existentes, não são tão desenvolvidas. Essas relações são importantes porque é através delas que as pessoas ficam sabendo de oportunidades de ajuda ou de emprego, mas também são algo pouco considerado pelas abordagens tradicionais da pobreza.

Conhecer essas redes envolve um trabalho qualitativo, através de etnografias (entrevistas que procuram entender o modo de vida das pessoas), como foi feito na favela de Paraisópolis (apresentada no capítulo 8 do livro). Ao contrário de áreas mais segregadas, essa favela tem acesso privilegiado a serviços, emprego e iniciativas assistenciais por estar próxima ao bairro nobre do Morumbi, na zona sul de São Paulo (ver especial Paraisópolis, revista diverCIDADE nº 3).
Arquivo CEM
José Bonifácio

A favela de Paraisópolis difere de locais como Cidade Tiradentes (bairro que já está entre os temas de pesquisas do CEM), que apresenta formação mais recente e agrega pessoas que estavam num momento difícil de vida, como despejados ou pessoas que perderam a moradia em deslizamentos. Tudo isso, aliado à segregação territorial, faz com que a rede social de Cidade Tiradentes seja bem menos desenvolvida.

A pobreza real

O livro também dá um primeiro passo no sentido de conhecer melhor a relação entre pobreza e segregação, abordando aspectos mais específicos como a educação, a dinâmica social das favelas e o emprego. A educação é um exemplo claro do chamado efeito de vizinhança, o fato de que crianças em áreas segregadas tendem a ter pior desempenho em comparação com crianças de mesmo perfil socioeconômico que vivem em outras áreas.

Arquivo CEM
Um dos motivos disso pode ser a influência exercida nas crianças pelas famílias e adultos da comunidade, que não oferecem um modelo no qual elas possam se espelhar. Ou seja, elevar o nível do ensino é um desafio que atravessa as gerações, e as políticas devem levar em conta a desvantagem real das crianças moradoras dessas áreas. Afinal, mesmo numa rede de ensino universalista há diferentes performances escolares dependendo de onde a criança reside.

Novo Silvina Audi, São Bernardo do Campo, próximo à represa.

No caso do emprego, as restrições de mobilidade, por conta dos elevados custos do transporte em áreas isoladas, dificulta o acesso a oportunidade de emprego (ver especial Trabalho e Desemprego, revista diverCIDADE nº 4). Por outro lado, a segregação diminui o contato com regiões mais abastadas onde pode existir oferta. Além disso, viver em lugares onde só moram desempregados faz com que seja difícil para toda a comunidade conseguir emprego ou tentar gerar renda dentro da comunidade.

Por uma política pública mais eficaz

Como então cortar o ciclo vicioso da pobreza? Embora exista hoje um consenso sobre a necessidade de políticas de transferência de renda para famílias em situação de pobreza absoluta, existe muita polêmica sobre a melhor forma de fazer isso. A chave para o problema pode estar em políticas públicas que usem como critério de seleção o local de moradia dos beneficiados.

“Precisamos pensar em políticas públicas integradas, com ações simultâneas de várias secretarias e órgãos setoriais, buscando elevar rapidamente as condições de vida existentes em áreas particularmente problemáticas”, diz Torres. “Também pode ser uma boa alternativa combinar estratégias territoriais com outras utilizadas atualmente, como o cadastramento de beneficiários.”

Para embasar melhor essas decisões, o CEM continuará concentrando esforços na análise da reprodução das desigualdades sociais na cidade. Na próxima fase, será realizado um estudo comparativo da pobreza em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Salvador. Será feita uma abordagem etnográfica – como a que já foi feita em Paraisópolis e está em andamento na Cidade Tiradentes – e outra analítica, através de mapas elaborados com dados do censo.

Arquivo CEM
Desmoronamento na favela de Paraisópolis

Links

Leia Introdução do livro São Paulo: segregação, pobreza e desigualdades sociais

Veja relação de artigos do livro

Entrevista no Estado de S. Paulo

Entrevista na Folha de S. Paulo

 

Versão para Impressão

 

SEGREGAÇÂO

MATÉRIA
>> CEM defende importância do território para uma melhor compreensão da pobreza
REPORTAGEM
>> Comparação entre favelas em Vila Mariana e Perus revela dificuldades de quem mora mais longe

ENTREVISTA

>> Perfil: Haroldo Gama Torres, coordenador da Área de Transferência de Tecnologia

DOCUMENTÁRIO
>> Filme aborda a relação entre moradores de favela na Vila Madalena e entorno rico
TRAILER
>> Veja trecho do filme Vizinhos
ARTIGO ASSINADO
>> Uma nova visão sobre a segregação urbana , por Renata Bichir, pesquisadora do CEM
SP EM DEBATE
>> Moradores das favela de Vila Mariana e Perus contrastam vida nas duas favelas
MAPA
>> Mapa apresenta tour fotográfico das diversas situações sociais em São Paulo
FOTOGRAFIA
>> Quando o carteiro chegar , livro de Mário Rui Feliciani
POESIA
>> Paixão por São Paulo – antologia poética paulistana , livro organizado por Luiz Roberto Guedes
NOTÍCIAS
>> Leia últimas notícias do CEM.